Eu queria começar essa newsletter de forma mais leve mas infelizmente não será possível. Isso porque desde o último fim de semana eu estou com a história de Christina Applegate na cabeça.
Você provavelmente viu na imprensa que a atriz de Disque Amiga Para Matar foi diagnosticada com Esclerose Múltipla, a mesma doença das atrizes Claudia Rodrigues e Selma Blair.
Christina apareceu visivelmente fragilizada na turnê de estreia da terceira temporada da série. Andando com ajuda de uma bengala, falou sobre ter lidado com o luto de ser diagnosticada com uma doença debilitante como essa, sobre não poder ficar em pé por muito tempo, dores, e sobre como isso afetou a produção da série. Uma situação triste, sem dúvidas.
O que está na minha cabeça desde então é que Christina engordou alguns quilos e, entre todas as suas preocupações, ela sentiu a necessidade de falar sobre isso. A atriz falou quase como se desculpando pelos quilos adquiridos enquanto lutava pela própria saúde.
Ela disse: "This is the first time anyone’s going to see me the way I am. I put on 40 pounds; I can’t walk without a cane. I want people to know that I am very aware of all of that," que em em tradução livre seria algo como: Essa é a primeira vez que as pessoas vão me ver como eu estou. Eu engodei 20kg; não consigo andar sem a bengala. Eu gostaria que as pessoas soubessem que estou ciente de tudo isso.
Boa parte das manchetes de jornal trouxeram, inclusive, a informação do peso que ela ganhou na chamada da notícia. Muitas publicaram fotos no estilo "antes e depois". Procure por Christina Applegate weight no google se tiver estômago.
Eu sinto muito que ela ache que deve qualquer coisa a alguém por isso. Eu queria abraçá-la e dizer: amiga, a gente é muito mais do que essa casca aqui. Na verdade a gente é o que sobra se a casca for embora.
No entanto, pareço body positive mas tenho minhas nóias também. Até parei para pensar, como alguém que se sente culpada pelo peso que ganhou na pandemia, se eu sentiria essa necessidade de me explicar sobre meu peso, e acho honestamente que sim. Agora, porque diabos a gente sente culpa por engordar?
É imensamente triste que a gente ainda acredite que a gente tem que cuidar dos filhos, educar, cuidar de casa, trabalhar, estar sempre linda, arrumada e magra, mesmo quando a gente está lutando pela nossa vida. A primeira “obrigação” é estar bela.
O que eu sinto não tem nome, é muito mais que raiva.
Esse controle dos nossos corpos ainda vai nos enlouquecer depois de nos adoentar fisicamente. A minha geração já vem traumatizada desde os anos 90 e a gente não aguenta mais. São as nossas mães, avós, as outras mulheres, os homens, as revistas, todos sempre prontos para nos dizer o quanto somos insuficientes não importa o que façamos.
(Insira aqui de forma imaginária aquele áudio de "Eu não aguento mais!")
Infelizmente, se a gente não consegue convencê-los, ou ao menos impedi-los de continuarem a falar dos nossos corpos, nos resta lutar para eles não nos convençam de que somos menos por isso.
Então segura a mão da tua amiga e vamos todas repetir o mantra: Meu valor não está na minha aparência… meu valor não está na minha aparência…
Para continuar no tema
A recomendação de livro de hoje é Mean Baby de Selma Blair, ainda sem edição em português. Esse é um livro de memórias da atriz para além do diagnóstico de MS. Conta sua história como garota rebelde de Hollywood, o vício em álcool para fugir das dores precoces no corpo e na alma, e os momentos em que ela flertou com a morte. Tudo em suas palavras, uma forma de ter controle da sua própria narrativa.
Para sair do tema pois ninguém aguenta mais
Assista Disque Amiga para Matar (Dead to Me) para um comédia leve porém não vazia. É a história de duas desconhecidas que viram amigas, que viram inimigas, que viram amigas de novo… tudo em torno de um crime. A série tem 3 temporadas disponíveis na Neftlix.
Me deixa saber se você também não aguenta mais nos comentários.
Eu tb não aguento mais. E o pior é sentir que às vezes eu sou meu pior carrasco por estar com toda essa pressão estética tão enfiada dentro de mim.